Pára o bonde que eu quero descer!
Todo mundo já deve ter visto as notícias sobre o corte do orçamento da Educação (30%) e as novas regras para concessão de benefícios como o seguro-desemprego. Mas as pessoas somente sentirão o efeito nocivo de tais políticas no decorrer do ano. Como já se sabe, 2015 vai ser um ano economicamente difícil, com alta taxa de inflação, endividamento da população, crise energética e hídrica, aumento de impostos, diminuição de investimentos... O pacote de medidas anunciado estrategicamente no início de janeiro, enquanto a classe trabalhadora está ainda sob o torpor das festas de final de ano, tem o objetivo de "fazer as contas fecharem". Acrescente-se um detalhe importante: quem vai pagar a conta?
Conta? Que conta?
Novamente, é a classe trabalhadora. Afinal, a política fiscal (o que inclui os impostos) brasileira incide com um peso maior sobre os bens e serviços básicos se comparado ao imposto que incide sobre a propriedade privada e rendimentos (Imposto de Renda, por exemplo). Além disso, as altas taxas de inflação ao longo dos últimos 12 meses também afetam principalmente a classe trabalhadora, tendo em vista que há um certo "atraso" entre o aumento de preços e o aumento dos salários. Frequentemente, os salários e bolsas acumulam perdas reais. Como, então, os meros mortais fazem a "conta fechar" em suas humildes residências? Entre outras opções, endividando-se (leia-se cartão de crédito). Pois bem, como foi anunciado, o imposto sobre o crédito também aumentou. Ou seja, quem tem dívidas vai pagar mais caro. Mas engana-se quem acha a medida justa, afinal, o aumento do imposto é apenas para as operações de crédito de pessoas físicas. Isto é, as grandes empresas ficam de fora dessa.
O endurecimento da concessão de benefícios, ao contrário do que o governo diz, não é para corrigir uma distorção no comportamento das pessoas. Pelo contrário, é simplesmente para diminuir o gasto estatal com a Assistência Social. A principal medida, que afeta a concessão do seguro desemprego, terá um efeito péssimo para os jovens, tendo em vista que a carência inicial é de 18 meses. Ou seja, ao perder o emprego pela primeira vez, um jovem deve esperar 18 meses (1 ano e 6 meses) até conseguir dar entrada no seguro desemprego. Até lá, já morreu de fome. Engana-se quem pensa que isso é para fazer as pessoas quererem trabalhar. Na verdade, as pessoas querem trabalhar, mas falta qualificação (problema na área da Educação) e faltam oportunidades (recessão, diminuição do investimento). Então, o problema mesmo é falta de vergonha na cara mesmo de nossos ilustres representantes políticos, que pintam tamanho ataque à classe trabalhadora com um verniz de "para combater a crise" ou de "para corrigir distorções". Vamos começar a corrigir as distorções pelo Congresso Nacional, então?
Mais sobre o corte...
Sobre o corte no orçamento, é preciso esclarecer que ele se deu em diversas áreas, não apenas na Educação. Porém, o maior corte foi com certeza na Educação, de 586 milhões de reais. O segundo colocado, a área de Defesa, teve corte de 157 milhões. Ou seja, há um peso muito maior sobre a área de educação. Engraçado que a Educação é justamente uma das áreas mais pobres do Brasil, pois carece de infra-estrutura, de novos concursos públicos, de um melhor plano de carreira e de melhores salários. Bem, falando em salário, houve aumento de 13% no piso nacional de professores de escolas públicas. Quem viu essa notícia ficou feliz, né? Confesso que até eu abri um sorriso. Pois é, o que aconteceu de fato foi que a Dilma deu com uma mão (uma migalha) e retirou boa parte do bolo com a outra. Afinal, o corte equivale a 30% do orçamento da Educação. Além disso, a conta do aumento do salários dos professores é dividida com os estados e municípios. Espertinha você, né, Dilma?
É importante esclarecer também que o corte ainda não é permanente. Como o Congresso Nacional ainda não aprovou o orçamento deste ano, e só deve fazê-lo depois do Carnaval (é sério, gente, não é piada), a Lei de Diretrizes Orçamentárias determina quanto o Executivo pode destinar a cada área. Até agora, o cálculo era bem simples e fazia sentido. Dividia-se o montante anual em 12 partes (afinal são 12 meses em um ano... voi là!). Com o decreto presencial, agora o limite é de montante anual dividido por 18! Você não é bom em matemática? Fica tranquilo, pelo resultado do Enem de 2014, você não está sozinho nessa. Vou ilustrar, então. Pense em uma pizza média (o orçamento da Educação é modesto). Agora divida em 12 partes. Ok, era assim antigamente. Agora, imagine a mesma pizza média dividida em 18 minúsculas fatias. Deu pra entender?
"Fechando a conta"...
Bem, se o governo federal traiçoeiramente "fez a conta fechar" com corte na Educação, diminuição de benefícios trabalhistas e aumento de impostos, você sabe como se dará a mágica para "fechar a conta" da Educação? Não há mágica, cortam-se as despesas consideradas "não-essenciais": tais como as bolsas dos programas de iniciação científica e, possivelmente, as bolsas de pós-graduação, além da pensão dos aposentados de Universidades, entre outras coisitas más. Por que as bolsas são relevantes? Primeiro porque boa parte das publicações feitas em universidades públicas são feitas por bolsistas de iniciação científica e pós-graduação, não apenas pelos docentes em si. Ou seja, o governo está dando um grande tiro no pé. Segundo, as universidades que já estavam em crise financeira, tal como a USP (a universidade modelo brasileira), agora mesmo é que não conseguirão "fechar a conta". O que pode resultar? Pode ocorrer a tentativa de privatizar essas universidades...que m****!
Bem, mas o corte é temporário, certo? Não exatamente, pois essa fração de 1/18 da Lei de Diretrizes Orçamentárias pode ser adotada no Orçamento da União de 2015. Em tal situação, aí sim o corte se tornaria permanente. Parece-me que os governantes do PT e PSDB (Dilma e Alckimin) esconderam muitas informações relevantes do eleitorado sobre a verdadeira dimensão das crises hídrica, energética e econômica. E, para "fechar a conta" da democracia burguesa, querem fazer quem tem menos pagar a conta. E quem é que vai "fechar a nossa conta"?
Isso me lembra de uma boa e velha música. E, como ela diz, "até quando esperar?" Pois me parece que o povo, em especial a classe trabalhadora e a juventude, não pode se dar ao luxo de esperar e deve se mobilizar para barrar medidas tão nocivas. 2015 deve ser um ano de muitos protestos, greves e mobilizações.
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