A saúde mental na pós-graduação
Hoje gostaria de falar a respeito de um tema um tanto quanto tabu ainda. Na nossa sociedade, fala-se abertamente sobre saúde, mas fala-se muito pouco sobre saúde mental e, menos ainda sobre a saúde mental na pós-graduação. Eu acredito que é importante falar a respeito, não apenas para conscientizar as pessoas a respeito da seriedade da questão, mas também para servir de alerta a quem começa o caminho da pesquisa.
Bem, uma das grandes causas de ansiedade na profissão de pesquisador é que ela não é vista como tal em nosso país. O mais próximo do "pesquisador" profissional seria x professorx universitárix. Mas alunxs de graduação (PIBIC e PET, por exemplo), de mestrado e doutorado também são pesquisadores. Essa incerteza semântica reflete, a meu ver, a pouca importância que se dá à ciência e à pesquisa no nosso país. E creio que isso tem ficado mais evidente nos últimos anos, com cortes de orçamento, crises de universidades públicas, o medo do corte de bolsas e da privatização do ensino público. Portanto, ser pesquisador no país nesse momento não é fácil.
Há também outras causas de ansiedade e frustração para pesquisadores, em especial para alunxs de pós-graduação. Por exemplo, há mais leituras e a densidade dos textos é maior também do que na graduação. Espera-se mais a frequência e a participação em aula também (sentar no fundão e fazer cara de parede não funciona, pedir pro amigo botar o nome na lista de presença não cola). E para além de conseguir ser aprovado nas disciplinas, espera-se que o pós-graduando produza de diversas formas, seja publicando artigos científicos, apresentando em eventos, contribuindo com capítulos de livros, etc. E o número de atividades se torna muito maior ao considerarmos a rotina dxs professorxs universitárixs, que são responsáveis por ensino, pesquisa, extensão e que ainda acumulam atividades administrativas dos cursos e dos programas de pós-graduação.
Outro motivo de angústia para os pós-graduandos é quando nos aproximamos da defesa, não apenas por garantir os prazos de escrita do texto e por se preparar para a defesa, mas também porque isso significa o fim do vínculo institucional e o fim dos pagamentos da bolsa. Para quem é bolsista, o fim do mestrado traz a angústia de ter que adiantar um doutorado, por exemplo, para garantir a sobrevivência. E para quem termina o doutorado, há a angústia de tentar passar em um concurso público na sua área (quando há) ou de adiantar um pós-doutorado. Para quem não é bolsista, então, realizar um mestrado ou doutorado enquanto trabalha é um desafio maior ainda, comparável ao de um malabarista.
Mas na minha opinião a causa mais grave de ansiedade mental para os pós-graduandos é a solidão. Apesar de haver muitos eventos acadêmicos e das disciplinas proporcionarem uma interação até muito prazerosa, a necessidade de dar conta das diversas leituras, artigos e capítulos da própria pesquisa pode levar ao pós-graduando a se isolar, evitando a companhia de amigos, adiando o lazer ou fazendo uso dele de forma destrutiva (a famosa procrastinação), trocando horas de sono e alimentação mais saudável por horas na frente do computador e cafeína.
Por isso, meu conselho a quem está pensando em começar o caminho da pesquisa é de cuidar da saúde mental, de tentar criar uma rotina que contemple descanso, atividade física, alimentação, estudo e lazer. E, para os colegas pesquisadores, o que posso dizer é que a negação é uma armadilha. Muitas vezes, apesar de estarmos nos sentindo infelizes, resistimos a dar o braço a torcer e a procurar ajuda. Isso é pior porque enquanto negamos as questões emocionais, a angústia e a tristeza podem crescer e se agravar. Pessoalmente, percebi esse ano que tendo a emanar para as outras pessoas uma "aura" de perfeccionismo e de fortaleza, mas, na realidade sei que não sou assim. Tive depressão em 2005 e tenho outras questões emocionais para lidar cotidianamente. E em 2018, percebi que era o momento de deixar o orgulho de lado e buscar ajuda novamente. Infelizmente, é difícil conseguir atendimento psicológico gratuitamente para sessões de terapia individual, mas existem outras organizações, gratuitas, como a irmandade de Neuróticos Anônimos e o Centro de Valorização da Vida (basta discar 188).
Palavras-chave: saúde mental; pós-graduação; prevenção
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